Semana passada rolou São Paulo Fashion Week, o principal evento de moda da América Latina, e alguns desfiles chamaram atenção pelo seu casting cheio de representatividade. Parece que não é só la fora que modelos negras e negros estão conquistando espaço. Mas o que isso significa para o mercado de moda nacional?
Só para pontuar, a indústria de moda brasileira ainda é majoritariamente branca. E quando eu me refiro a indústria, eu falo de um ciclo que começa desde agências que contratam mais gente branca do que negra, até você que consume uma marca que não te representa nas campanhas publicitárias.
Um desfile em especial protestou contra essa realidade. A Lab, marca do rapper Emicida com seu irmão Evandro Fióti, apresentou um casting não só com vários modelos negras e negros, mas gordas e gordos também.
Mas Alexandre Herchcovitch já não tinha feito isso em 2014? Já. Mas a diferença é quem está lucrando por trás dessa história. Trazer só modelos negros para passarela é super louvável, eu adorei, mas um homem branco lucrando com isso ainda ajuda a manter a ordem das coisas. E depois que ele apresentou sua coleção masculina, que por si só tem menos visibilidade na mídia.
Já com a Lab a conversa é outra. A marca é encabeçada por negros e para negros. A a coleção, que foi desenvolvida com o estilista João Pimenta, tem como inspiração um samurai negro chamado Yasuke. O guerreiro teria nascido em Moçambique, no século XVII, e se tornou samurai no Japão. Teve até peça sem distinção de gênero no desfile, ou seja, poderia ser usado por homens e mulheres. Confira aqui os pontos de venda da marca.
Dentre os modelos selecionados, o baiano Felipe Rocha marcou presença. O desfile funcionou como uma das restritas oportunidades dele mostrar o trabalho como modelo. Para ele, essa é uma evolução na história da moda brasileira.
“Cada dia que passa, eu estou percebendo que os negros estão ganhando mais espaço no mercado da moda. Temos que ter calma e mostrar que somos capazes de realizar o trabalho da melhor forma. Assim sempre seremos lembrados como profissional e não como um negro para preencher o casting”, conta.
Felipe diz que já teve desfile que ele foi o único homem negro a pisar na passarela. “Sempre sinto uma responsabilidade enorme, não posso falhar. E vejo que se me escolheram foi porque meu histórico profissional está ótimo, né?”, brinca.
No camarim, ele diz não ter tempo ruim com maquiagem. Por cuidar bem da pele, o trabalho dos maquiadores é muito fácil. “Se bem que quase nunca usam maquiagem em mim. Sempre passam hidratante no meu rosto e pronto, estou maquiado!” Não deixe de conferir as tendências de maquiagem nas semanas de moda internacionais.
E por falar em representatividade, não poderia deixar de concluir essa matéria sem falar do desfile lindíssimo de Ronaldo Fraga, o primeiro da história no SPFW com um casting 100% trans. Para quem resiste em acreditar que a moda pode se tornar uma arma política, tá aí um exemplo de militância na passarela. Eu nem consegui prestar atenção nos vestidos, que estavam simples e bonitos, diga-se de passagem. Aqui é interessante pensar indumentária e identidade trans.
A roupa estava tão em segundo plano que, ao final, as modelos voltam para o palco e dançam só de lingerie.
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