O governo de Michel Temer bateu recorde de rejeição nesta semana. Segundo pesquisa do Datafolha, 61% dos brasileiros consideram a gestão do peemedebista ruim ou péssima. Parte desse resultado é consequência da sua agenda de reformas impopulares, como a reforma trabalhista. Mas o que isso tem a ver com a aparência física?
A reforma trabalhista trata de muitas questões. Uma delas é sobre a aparência dos funcionários no ambiente de trabalho, um ponto que não ganhou espaço na mídia hegemônica até o momento. O artigo 456-A da redação final do projeto aprovado na câmara diz o seguinte:
“Cabe ao empregador definir o padrão de vestimenta no meio ambiente laboral, sendo lícita a inclusão no uniforme de logomarcas da própria empresa ou de empresas parceiras e de outros itens de identificação relacionados à atividade desempenhada.”
Para entender como as coisas vão funcionar daqui pra frente, a advogada Lívia Marques Siqueira diz que é preciso harmonizar esse novo artigo com outras disposições legais que já existem no Brasil. Quando a gente fala em uniforme de trabalho, estamos falando também do cabelo e maquiagem, ou seja, da aparência como um todo.
O artigo, em tese, permite que o empregador decida sobre a vestimenta dos funcionários, mas a discriminação e a humilhação continuam sendo ilegais. Porém, o racismo nem sempre pode ser identificado e comprovado facilmente.
Nas redes sociais, muitas pessoas, principalmente mulheres, relataram episódios de racismo no ambiente de trabalho. Uma parcela das agressões veio da parte empregadora. A maioria se queixava de como o cabelo era percebido pelos patrões: feio, desarrumado e até sujo.
Foi o que aconteceu com Carlos* no restaurante japonês que ele trabalhava. Ele resolveu deixar o cabelo crescer e assumir o black. “Coincidentemente”, ele passou a receber olhares desconfortantes do seu chefe. Carlos foi demitido pouco tempo depois por causa da “crise”, como alegou seu patrão, mas ele não descarta a hipótese de racismo.
Ísis de Oliveira já ouviu injúria racial no trabalho por conta de seu black. Ela trabalhava em uma lan house e lidava diretamente com o público. Seu patrão chegou até a mandar ela alisar o cabelo pra ficar mais bonita. Ísis fingia não ligar, mas disse que se sentia péssima por dentro. Ela afirmou também que tinha medo de ser demitida se falasse alguma coisa.
Lívia pensa que o perigo da amplitude do artigo é justamente esse, uma discussão ligada a casos individuais que serão vistos pela Justiça do Trabalho. Lembrando que agora há alguns empecilhos que dificultam o acesso à esse tipo de justiça.
No entendimento da advogada, as mulheres e a comunidade negra (principalmente as mulheres negras) são as mais afetadas negativamente quando se fala de relação de trabalho: desde o assédio moral, até os baixos salários. E com a reforma proposta não é diferente.
O texto da reforma é bem grande e mexe com questões que não vem sendo discutidas profundamente. A questão da equiparação salarial, horário mínimo de almoço e férias picotadas são só algumas delas.
Eu quis trazer apenas um artigo da redação final para um blog que trata de beleza e negritude, mas queria pedir aos produtores de conteúdo que levem essa discussão para seus segmentos. Quem tiver interesse em checar, o texto completo está disponível no site da Câmara dos Deputados. Agora o texto da reforma segue pra votação no Senado.
*Nome fictício, o personagem prefere não se identificar.